Livre-Arbítrio e o Estado Quádruplo do Homem

por

Ernest C. Reisinger

 


Neste capítulo, continuaremos a considerar o livre-arbítrio e o estado quádruplo do homem. No último capítulo, consideramos a vontade do homem no estado de inocência e a vontade do homem no estado de degeneração (seu estado não regenerado).

O Estado da Graça ou O Estado de Regeneração

Neste estado a pessoa é tanto um santo com um pecador ao mesmo tempo. Neste terceiro estado o poder livre de escolha pertence ao homem como uma pessoa regenerada, mas sua vontade não é todavia perfeita como o será no estado glorificado.

Neste estado de graça, a vontade não mais usa sua liberdade abertamente para fazer o que é mau, como fazia antes da regeneração. Agora a vontade escolhe – tanto parcialmente o bem como o parcialmente o mau.

Neste estado de regeneração, há liberdade do amor ao pecado e do domínio do pecado. “Porque o pecado não terá domínio sobre vós” (Romanos 6:14). Nosso Senhor disse, “E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8:32).

Zacarias Ursino, em seu Comentário Sobre o Catecismo de Heildelberg, nos dá uma excelente exposição sobre a vontade do homem no estado de graça:

O regenerado faz o que é bom, porque o Espírito Santo, por sua especial graça, renova a natureza do homem através da Palavra de Deus – ascendendo nova luz e conhecimento no entendimento, e despertando no coração e na vontade novos desejos e inclinações, que estejam em harmonia com a lei divina; e porque o Espírito Santo eficazmente inclina a vontade para fazer aquelas coisas que estejam de acordo com este conhecimento, e com aqueles desejos e inclinações. Este é a forma de como a vontade recupera tanto o poder de desejar o que é aceitável a Deus, como o uso deste poder, de forma que ele comece a obedecer a Deus de acordo com aquelas declarações de Sua palavra: “O SENHOR teu Deus circuncidará o teu coração”. “Dar-vos-ei um coração novo, e porei dentro de vós um espírito novo; e tirarei da vossa carne o coração de pedra, e vos darei um coração de carne”. “Onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade”. “Qualquer que é nascido de Deus não comete pecado” (Deuteronômio 30:6, Êxodo 36:26, 2 Coríntios 3:17, 1 João 3:9). As razões, pelas quais a vontade neste terceiro grau escolhe e faz em parte tanto o que é bom como o que é mau, são as seguintes: 1. Porque a mente e a vontade daqueles que são regenerados, não são perfeitamente renovadas nesta vida. Há muitos remanescentes de depravação que acompanha o melhor dos homens, durante todo o tempo que eles continuam na carne, de forma que as obras que eles realizam são imperfeitas, e manchadas com pecado. “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum” (Romanos 7:18). 2. Porque aqueles que são regenerados não são sempre governados pelo Espírito Santo; mas algumas vezes são abandonados por Deus por um tempo, para que Ele possa assim prová-los ou humilhá-los. Todavia, embora eles sejam assim deixados por si mesmos por um tempo, não perecerão finalmente, porque Deus, em Seu próprio tempo e modo, os chama ao arrependimento. “Não retires de mim o teu Espírito Santo”. “Por que, ó SENHOR, nos fazes errar dos teus caminhos? Por que endureces o nosso coração, para que não te temamos? Volta, por amor dos teus servos”.(Salmos 51:11, Isaías 63:17). Em resumo, depois da regeneração, há uma tendência a escolher parcialmente o bem, e parcialmente o mau. Há uma tendência ao bem, porque a mente e a vontade sendo iluminadas e transformadas, sendo, em certa medida, voltadas para o bem, e iniciadas na nova obediência. Há uma tendência ao mau, porque os santos são somente imperfeitamente renovados nesta vida – retém muitas debilidades e desejos maus, por causa do pecado original, que ainda os acompanha. Por conseguinte, as boas obras que eles realizam não são perfeitamente boas. [3]

Portanto, neste estado de graça, o crente regenerado livremente escolhe o bem, todavia este bem está misturado com o mau por causa do pecado remanescente. Usar sua liberdade para escolher perfeitamente o bem acontecerá somente no quarto estado.


O Estado de Glorificação ou O Estado de Perfeita Regeneração

Neste estado de perfeita e gloriosa liberdade, a vontade do homem será perfeitamente restaurada e regenerada. Outra citação de Ursino será útil.

Neste estado, a vontade do homem será livre para escolher somente o bem, e não o mau. Este será o mais alto grau, ou a perfeita liberdade da vontade humana, quando obedeceremos a Deus completamente e para sempre. Nesta estado não somente não pecaremos, mas o abominaremos acima de qualquer outra coisa; sim, nós não mais seremos capazes de pecar. Em prova disto podemos aduzir as seguintes razões: Primeira, o perfeito conhecimento de Deus então brilhará na mente, enquanto será o desejo mais forte e mais ardente da vontade e do coração o obedecer a Deus; de forma que não haverá lugar para a ignorância ou duvida, ou o mínimo desprezo de Deus.

Em segundo lugar, na vida porvir, os santos nunca serão abandonados, mas serão constantemente e para sempre controlados pelo Espírito Santo, de forma que não será possível para eles desviar no mais insignificante respeito do que é justo. Por conseguinte, é dito: “Porque na ressurreição nem casam nem são dados em casamento; mas serão como os anjos de Deus no céu”. “ Seremos semelhantes a Ele”. (Mateus 22:30, 1 João 3:2). Os anjos bons são inclinados a fazer somente o que é bom, porque eles são bons; da mesma forma que os anjos maus, por outro lado, são inclinados a fazer o que é mau, porque eles são maus. Mas nós seremos como os anjos bons. Nossa condição será, portanto, uma de maior excelência do que a de Adão antes da queda. Adão era, deveras, perfeitamente conformado a Deus; mas ele tinha o poder para fazer tanto o bem como o mau; e portanto, com todos os seus dons, ele teve uma certa debilidade, isto é: a possibilidade de cair de Deus, e perder seus dons. Ele era bom de uma maneira mutável. Mas nós não seremos capazes de querer qualquer coisa, senão o bem. Da mesma forma como os ímpios são inclinados e levados a fazer o mau somente, porque eles são ímpios; assim, nós seremos inclinados a fazer o que é bom, e amar e escolher o bem somente, porque seremos bons de uma maneira imutável. Seremos, então, tão completamente estabelecidos na justiça e conformidade a Deus, que não será possível para nós cair dEle; sim, será impossível para nós desejar qualquer coisa que seja má, porque seremos preservados pela divina graça naquele estado de perfeita liberdade na qual a vontade escolherá o bem somente.

Destas coisas que temos agora dito com relação à liberdade humana, é manifestadamente uma grosseira blasfêmia dizer que tiramos a liberdade da vontade. E, embora aqueles que são renovados e glorificados não serão capazes de querer qualquer coisa senão o bem, depois de sua glorificação; todavia, seu poder de escolha será então livre numa extensão muito maior do que é agora; porque Deus, também, não pode desejar qualquer coisa senão o bem e, todavia, Ele possui perfeita liberdade de vontade. Assim, por outro lado, não tiramos o poder de escolha do ímpio, ou dos não regenerados, quando afirmamos que eles não são capazes de desejar qualquer coisa senão o que é mau; porque eles desejam e escolhem o mau livremente – sim, mui livremente. Sua vontade é inclinada e carregada com a maior impetuosidade para o mau somente; porque continuamente retém isso em seus corações, eles odeiam a Deus. Por conseguinte, todas as obras que eles realizam de um caráter moral externo, são mas à vista de Deus, como já demonstramos em nossas considerações sobre a doutrina do pecado.

Há seis coisas relacionadas a este Estado Eterno:

1. Morte: “Porque eu sei que me levarás à morte e à casa do ajuntamento determinada a todos os viventes” (Jó 30:23).

2. A Diferença entre o justo e o ímpio em sua morte: “Pela sua própria malícia é lançado fora o perverso, mas o justo tem um refúgio em sua morte” (Provérbios 14:32).

3. A ressurreição: “Não vos maravilheis disto; porque vem a hora em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz. E os que fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal para a ressurreição da condenação” (João 5:28-29).

4. O julgamento geral: “E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória; E todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas; E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda. Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: ‘Vinde, benditos...' [mas] aos que estiverem à sua esquerda: ‘Apartai-vos de mim, malditos...' E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna” (Mateus 25:31-34,41,46).

5. O reino do céu: “Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo” (Mateus 25:34).

6. Inferno: “Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos” (Mateus 25:41).


Pode ser visto que a Bíblia ensina que o homem não tem capacidade de se salvar, e deveras, perdeu o poder que Adão teve para escolher fazer o bem. Ele é perfeitamente livre para escolher e agir de acordo com sua própria natureza, da mesma forma que o homem glorificado livremente escolherá agradar a Deus em todas as coisas. Porque agora os homens não têm poder para agradar a Deus sem ter sua natureza radicalmente transformada pelo Espírito Santo. Nossos métodos e mensagens de evangelismo deveriam ser grandemente impactos por este fato. Ele é também é vitalmente importante para a fé Cristã.

NOTAS:

[3] - Zacharias Ursinas, Commentary on the Heidelburg Catechism (Phillipsburg, NJ: Presbyterian & Reformed, [Reproduction of second American edition, Columbus, Ohio, 1852]) 65

 


Extraído e traduzido do livro A Vontade de Deus, a Vontade do Homem e o Livre-Arbítrio, Capítulo 2.

Tradução livre: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 24 de Março de 2004


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