Uma objeção frequente contra a prática de permitir que crianças pequenas participem da ceia do Senhor é que elas são incapazes de realizar a ação que Paulo ordena em 1 Coríntios 11.28: “examine-se, pois, o homem a si mesmo”, em grego, dokimazetō anthrōpos heauton. Por que seriam elas incapazes? George Knight III afirma: “Paulo não dá diretrizes específicas para essa ação de examinar-se a si mesmo”. Ele acredita, porém, que “a única orientação que podemos depreender é o significado do verbo ‘examinar’”. A interpretação que Knight dá a esse verbo é a de que “cada pessoa, individualmente, deve olhar para dentro de si mesmo (ênfase minha — MC) para determinar se está tomando a ceia do Senhor de maneira indigna” (“1 Cor. 11:17-34: The Lord’s Supper” em The Auburn Avenue Theology: Pros and Cons, org. E. Calvin Beisner, p. 287).
No que segue, proponho mostrar que Knight está equivocado em todos esses pontos. Primeiro, quero argumentar, como questão de lexicografia grega, que ele erra quanto ao significado do verbo dokimazo e, portanto, também quanto à orientação que dele deriva. Creio ser um erro dizer que Paulo não dá diretrizes para como o dokimazo deve ser realizado; ao contrário, o contexto deixa claro o que os cristãos em Corinto deviam fazer. Como exemplo desse conteúdo fornecido pelo contexto para o teste de dokimazo, argumento, com base exegética, que o uso que Paulo faz do mesmo verbo em 2 Coríntios 13 — frequentemente citado como um exemplo introspectivo corroborador — é, de fato, demonstravelmente objetivo, e consiste na realização de ações compreendidas a partir do contexto.
Primeiramente, a lexicografia. Dokimazo não significa “olhar para dentro de si mesmo”. Não encontro tal uso nem no LSJ nem no Thesaurus Linguae Graecae. Todas as ocorrências que consigo descobrir são inequivocamente objetivas e exteriores. Em Demóstenes 18.266, lemos: “Estou sendo examinado para uma coroa”, e então ele fala sobre como é judicialmente inocente de todos os crimes. Isso não é introspectivo. Mais uma vez, nas Leis de Platão, 759D, alguns oficiais chamados “Intérpretes” estão sendo examinados. O escrutínio em questão, o teste indicado por dokimazo, consiste em “ver se um homem é saudável e legítimo, criado em uma família cujos padrões morais dificilmente poderiam ser mais elevados, e se ele mesmo, seu pai e sua mãe viveram sem mácula de homicídio ou de qualquer outro crime semelhante contra o céu”. Em outras palavras, trata-se mais uma vez de algo objetivo, não de “olhar para dentro de si mesmo”. Novamente, em Tucídides 6.53, vemos informantes criminais sendo testados; nesse caso, dokimazo indica uma verificação dos fatos contidos em seus relatos. Ou em Xenofonte, Memoráveis VI.1, encontramos uma discussão sobre testar amigos, em que o teste envolve perguntar se a pessoa é “senhora de seus apetites, se não está sob o domínio, isto é, de seu ventre, se não é viciada em vinho, luxúria, sono ou preguiça” e se ela é devedora ou contenciosa.
Mas não consigo encontrar uma única ocorrência da palavra que possa significar “olhar para dentro de si mesmo”. À primeira vista, parece impossível que, em 1 Coríntios 11, o simples fato de um pronome reflexivo ser o objeto de repente signifique que a introspecção é o meio pelo qual dokimazetō heauton se realiza. O próprio Paulo usa o verbo como culminação de uma série de expressões que denotam revelação pública e objetiva em 1 Coríntios 3.13: “a obra de cada um se manifestará; pois o Dia a demonstrará, porque está sendo revelada em fogo; e o fogo provará (dokimasei) qual seja a obra de cada um”. De fato, um levantamento dos usos da palavra na literatura grega dá grande plausibilidade à sugestão do relatório majoritário da OPC sobre a pedocomunhão, do livro Feed My Lambs, de Tim Gallant, e de diversas outras fontes, de que o teste em vista em 1 Coríntios 11 é se alguém está vivendo em amor e unidade com os demais crentes. Isso seria, mais uma vez, objetivamente cognoscível e não pareceria envolver introspecção — em suma, um requisito que bebês sequer têm capacidade de violar.
Knight e outros defensores da credocomunhão parecem, no entanto, não sentir o peso desse argumento lexical. Eles acreditam que um significado introspectivo para dokimazo pode ser extraído das próprias páginas da Escritura. O texto que citam como corroboração para sua leitura de dokimazo em 1 Coríntios 11.28 é 2 Coríntios 13.5, que diz:
“Examinai-vos a vós mesmos, se realmente estais na fé; provai-vos (δοκιμάζετε) a vós mesmos. Ou não reconheceis que Jesus Cristo está em vós? — a não ser que já estejais reprovados (ἀδόκιμοι).”
“Viu?”, diz o defensor da credocomunhão. “É preciso ver se você está na fé, verificando se Cristo está em você. Isso é introspecção!” A maneira mais persuasiva de derrubar essa leitura introspectiva do versículo é mostrar que ela sequer se encaixa no contexto de 2 Coríntios 12-13, quanto mais no de 1 Coríntios 11. O versículo faz parte de um argumento mais amplo, de caráter particularmente pungente e elegante — e esse argumento de Paulo só é compreensível se δοκιμάζω e seus cognatos se referem a realidades objetivas mencionadas no contexto imediato, e não à introspecção. No que segue, farei uma análise de 2 Coríntios 13.
Primeiramente, o quadro geral. Podemos começar observando que 2 Coríntios foi escrito por Paulo num momento em que suas credenciais como apóstolo estavam sendo atacadas por inimigos em Corinto, os quais promoviam falsas doutrinas de hiper-espiritualidade e consequente antinomismo. Esta é a carta em que Paulo é levado a fazer seu “louco” jactar-se de seu serviço a Cristo. O apóstolo está de coração partido. Ele ama os coríntios e odeia ter de discipliná-los e entristecê-los (2 Coríntios 2.1-2). Mas, apesar disso, é movido por um amor feroz e zeloso por eles: ele os quer a eles, não seus bens (2 Coríntios 12.14). Está de coração partido porque seu amor por eles não é correspondido. Eles questionam a veracidade de sua autoridade apostólica, de modo que ele se vê forçado a afirmá-la.
Essas são as duas partes em litígio: Paulo, de um lado, com sua autoridade sendo posta em dúvida; e os coríntios, de outro, que fizeram sua tão apregoada espiritualidade parecer muito duvidosa por meio de suas más obras. Ambas as partes são objetos potenciais de exame. Ambas são objetos adequados para o nosso pequeno verbo δοκιμάζω. E é precisamente isso o que Paulo planeja fazer.
No processo de desfazer o prestígio dos “super-apóstolos” que minavam seu trabalho, Paulo faz a observação contundente — suficiente, por si só, para refutar qualquer noção introspectiva de δοκιμάζω — de que “não é aprovado (δόκιμος) quem a si mesmo se recomenda, e sim aquele a quem o Senhor recomenda” (2 Coríntios 10.18).
Mas a verdadeira prova vem ao final da carta. Em 2 Coríntios 12.20-13.1, somos informados explicitamente de que, durante a iminente terceira visita de Paulo a Corinto, tanto ele quanto os coríntios serão provados quanto a estarem ou não em Cristo, ou quanto a estarem reprovados. Para os coríntios, o teste envolve se Paulo os encontrará “não como eu quero” — com “contendas, ciúmes, iras, porfias, detrações, intrigas, orgulho, tumultos”. Ele teme que “muitos dos que pecaram anteriormente não se tenham arrependido da impureza, prostituição e lascívia que cometeram”. Neste ponto, o leitor com razão recorda o homem que possuía a mulher de seu pai, e o orgulho inflado dos coríntios quanto a tal conduta, que julgavam “espiritual”.
Para Paulo, porém, a prova envolve a demonstração de sua autoridade, da qual os coríntios duvidam. Estão sob a influência de falsos mestres, que espalharam a ideia de que Paulo apenas escreve cartas de aparência imponente, e que ninguém deveria temê-lo. Tudo bravata. Em resposta a isso, Paulo ameaça usar seu poder apostólico — o poder de Cristo. Já o fez antes (12.11-12), e agora adverte (13.2) que “se eu for outra vez, não os pouparei…” Por quê? “… visto que vocês estão buscando prova de que Cristo fala em mim” (ἐπεὶ δοκιμὴν ζητεῖτε τοῦ ἐν ἐμοὶ λαλοῦντος Χριστοῦ). Notem bem: a palavra “prova” é δοκιμή, cognata próxima de δοκιμάζω. Paulo sabe perfeitamente que é apóstolo. Mas sua consciência disso nada prova. O que importa é que os coríntios sejam convencidos da autoridade de Paulo, pela demonstração do poder de Deus. A pressuposição é que, se ele os poupar — se não aplicar as consequências por meio do poder que lhe foi delegado por Cristo — então os coríntios não aceitarão seu apostolado. Ele não os poupará. Usará seu poder. E isso constituirá sua δοκιμή; isso mostrará que ele é δόκιμος. Assim ele diz (13.6): “Mas espero que vocês reconhecerão que não somos ἀδόκιμοι”.
E quanto aos coríntios? O temor de Paulo é que os encontre “não como eu quero”. Mas esse não é seu desejo. Sua esperança é que eles corrijam sua conduta e que ele não seja forçado a aplicar seu poder contra eles. Assim, imediatamente após a ameaça de punição, a frase seguinte se inicia com δέ: “Mas (δέ) oramos a Deus para que não façais mal algum”.
Segue-se uma cláusula que sempre me intrigou, mas que agora se torna clara à luz da dupla provação que Paulo tem em vista. Por que ele ora para que não façam o mal? — “não para que nós pareçamos δόκιμοι, mas para que vós façais o bem, embora nós sejamos como ἀδόκιμοι”. O desejo de Paulo é chegar a Corinto e encontrar os coríntios tão completamente reformados em sua conduta que ele não precise apresentar prova (δοκιμή) de sua autoridade. De fato, ele prossegue dizendo que, se os encontrar melhores, não poderá usar seu poder: “porque nada podemos contra a verdade, senão pela verdade”.
O anseio de Paulo, portanto, é que os coríntios sejam δόκιμοι mediante o abandono dos pecados grosseiros que ele enumerou em 12.20-21, ainda que isso signifique — e necessariamente significará — que ele mesmo pareça reprovado (ἀδόκιμος) por não demonstrar seu poder. Assim, “alegramo-nos quando estamos fracos e vós fortes” (13.9).
Paulo conclui sua exortação declarando: “Portanto, escrevo estas coisas, estando ausente, para que, quando presente, não use de rigor, segundo a autoridade que o Senhor me conferiu para edificação, e não para destruição”.
Em tudo isso, a introspecção não tem papel algum. Quando Paulo exorta os coríntios a δοκιμάζετε a si mesmos, ele quer dizer: “corrijam sua conduta de modo que passem na prova quando eu for vê-los”. Quanto a Paulo, em seu desfecho preferido, ele será “como ἀδόκιμος”, porque não terá feito demonstração visível e objetiva da “rigidez” de seu poder apostólico. Ambas as provas dizem respeito a uma das partes exibir algo que a outra possa observar.
Quando o mesmo procedimento hermenêutico é aplicado a 1 Coríntios 11.28 — como o fizeram Gallant, Leithart e muitos outros exegetas defensores da pedocomunhão — os resultados não surpreendem: facciosidade, contendas, divisões de classe e comportamento ganancioso à mesa são as realidades objetivas sobre as quais Paulo fala no contexto imediato; a introspecção não está de modo algum em vista, e de qualquer forma não faria nada, por si só, para corrigir os problemas que Paulo quer ver corrigidos.
O mesmo sentido exterior e objetivo é evidente em Tito 1.16, onde Paulo fala da conhecida e característica perversidade dos cretenses, advertindo Tito a não nomear o tipo errado de homem como presbítero. Ele diz: “No tocante a Deus, professam conhecê-lo; entretanto, o negam por suas obras (τοῖς ἔργοις), sendo abomináveis, desobedientes e reprovados (ἀδόκιμοι) para toda boa obra (πρὸς πᾶν ἔργον ἀγαθὸν)”. A construção “para toda boa obra” é estranha — normalmente não se falaria de boas obras como algo para o qual se deve passar por uma prova (antes de ser autorizado a realizá-las?). Mas a frase se esclarece em Tito 3.1, onde Paulo diz a Tito: “Lembra-lhes [isto é, ao povo peculiar de Jesus, de 2.14] que se sujeitem aos que governam, às autoridades, que sejam obedientes, e estejam preparados (ἑτοίμους εἶναι) para toda boa obra (πρὸς πᾶν ἔργον ἀγαθὸν — mesmas palavras de 1.16)”. Assim, δόκιμος (reprovado) é contrastado com ἑτοίμους (pronto). Ambos se baseiam num “histórico” anterior. Paulo quer que os presbíteros sejam homens de zelo comprovado e estabelecido na prática do bem; se demonstraram o contrário, estão reprovados.
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
Fonte: https://paedocommunion.com/articles/colvin_self-examination.php