Classificação do filme: Fantasia Mitológica
Uma adaptação fenomenal do clássico de C. S. Lewis! De fato, diria que este é um dos poucos filmes melhores que o livro. Não fiquei impressionado com o livro, mas chorei durante todo o filme por causa de sua magia profunda, isto é, sua encarnação mitológica. Lúcia é adorável .
Uma de minhas cenas favoritas é quando ela sorri por causa de seus irmãos incrédulos, abismados, em Nárnia pela primeira vez, e diz com certa ironia: “Não se preocupem, é apenas a imaginação de vocês”.
A Rainha do Gelo é interpretada com toda a maldade, e Aslam é perigoso, mas é bom. Algo que chamou minha atenção no filme foi a apresentação positiva da cultura medieval da cavalaria. Neste ponto, os produtores foram leais aos antecedentes ingleses de Lewis, bem como à sua graduação em romantismo medieval. Foi revigorante observar a honra coragem e o dever lutando contra o mal como meios de liberdade e justiça .
Por essa razão, liberais , socialistas e outras pessoas ligadas à modernidade não gostarão deste filme, por incorporar verdades detestadas por eles. Aslam permite que Pedro mate o lobo maligno com sua espada como um rito de masculinidade e para tornar-se um cavaleiro honrado. Uau ! Isso é politicamente incorreto — e fiel à realidade .
Num dos momentos mais belos do filme, a Feiticeira Branca apela para a Magia Profunda, “mais poderosa que qualquer um de nós, e governa o destino de todos, de vocês e o meu”, e afirma que a lei exige sangue para a realização da justiça verdadeira.
Isso com certeza é abominado como barbárie primitiva pelos que, em nossa sociedade, culpariam as vítimas (a menos que isso constitua racismo), e procurariam compreender os transgressores (como alguns islâmicos fascistas), em lugar de fazer justiça, e pensariam em permitir que os criminosos fossem libertados porque “sentem-se” arrependidos ou se comportaram como bons meninos na cadeia — imaginando fazer, de alguma forma, justiça.
Este filme demonstra que as exigências da Lei são “olho por olho”, e que essa fórmula não é desonesta ou injusta , mas a única forma de justiça; de outra forma, o mal reinaria. A rejeição do “olho por olho” é a barbárie que destrói a civilização — o que nos leva à mitologia cristã do filme. Alegrei-me muito por ela não ter sido suprimida.
Claro, a essência do cristianismo é a expiação substitutiva de Cristo por seu povo. Não fomos perdoados porque Deus acenou e permitiu que os criminosos do universo tivessem passagem livre — isso seria injusto para com as vítimas. Em vez disso, Jesus tomou sobre si mesmo a pena de morte por todos os crentes. Isto, e apenas isto, é o enigma filosófico-teológico da união perfeita do amor e da justiça.
A lei divina requer o pagamento da penalidade (justiça), mas o amor de Deus é demonstrado no sofrimento da penalidade a favor de seu povo (Romanos 5:6-10). Isto é a Lei e o Evangelho, e ambos são necessários para a comunicação eficiente da redenção. Como um espelho, a lei de Deus mostra-nos, criminosos do universo, a culpa referente aos nossos pecados (Romanos 3:19,20). Entretanto, o Evangelho é as boas novas de que Jesus pagou a penalidade para libertar-nos (Romanos 6:23). Como Aslam explicou: “Se uma vítima voluntária, inocente de traição, fosse executada no lugar de um traidor”, então a “ Magia Profunda” seria cumprida, isto é, a lei seria cumprida mediante o sacrifício expiatório de Cristo.
Algumas das analogias mais poderosas do Evangelho encontram-se neste filme. Claro, a Mesa de Pedra do sacrifício é um símbolo pagão do aplacamento dos deuses, como a crucificação era uma modalidade romana de punição. Aslam não diz nenhuma palavra e é tosquiado antes de ser morto, como Cristo ficou calado e foi espancado e humilhado antes de morrer (Isaías 53:5-7).
A Feiticeira Branca , antes de eliminar Aslam, diz de maneira jocosa: “Contemplem o Grande Leão”, da mesma forma que os opressores de Jesus zombaram dele dizendo: “Salve, rei dos judeus!” (João 19:3). Quando Aslam ressuscita acontece um terremoto, do mesmo modo que ocorreu junto ao túmulo de Jesus quando ele ressuscitou (Mateus 28:2). Ah, duas garotas estavam lá quando Aslam ressurgiu, como as duas mulheres que viram o Cristo ressurrecto (Mateus 28:1).
Ao matar a Feiticeira Branca, Aslam diz: “Está consumado” — palavras idênticas às últimas proferidas por Jesus, na cruz, quando a salvação foi assegurada e o poder da morte e do Diabo destruído (João 19:30; Hebreus 2:14).
Ele sopra nas estátuas para trazê-las à vida, como Jesus soprou sobre seus discípulos para outorgar-lhes o Espírito Santo que os ressuscitou espiritualmente dentre os mortos (João 20:22).
Foram omitidas as expressões “Filhas de Eva” e “ Filhos de Adão”, referências ao Gênesis e ao pecado original (Romanos 5), mas também a glória dos seres humanos à imagem de Deus como filhos de Adão e Eva (Atos 17:26). [1]
Adorei a desforra branda da demitologização moderna da religião. Em Nárnia, a “Terra do Mito”, Lúcia observa alguns livros, e um deles é intitulado É o homem um mito? Que alfinetada !
Dois pequenos desapontamentos: transformaram a expressão clássica a respeito de Aslam: “Mas ele é tão perigoso assim ?”, “Claro que é, perigosíssimo. Mas acontece que é bom”, em: “Ele não é um leão domesticado, mas é bom”. E também mencionaram apenas uma vez o epíteto de Nárnia: “Aqui é sempre inverno e nunca Natal”. Ele deveria ter sido repetido muitas vezes por ser o símbolo de quão impiamente os homens desejam retirar Deus da sociedade, como chamar o Natal apenas de “feriado” ou a tentativa de erradicar todos os símbolos da influência divina sobre a cultura. Soa familiar? De qualquer forma, Lewis e Tolkien são duas das maiores forças contra a modernidade ao assegurar que é correto “crer”, demonstrando o caráter da mitologia moderna como mau e destrutivo ao extremo. Escreverei um livreto ou um livro, no final deste ano (se vocês quiserem ler mais a respeito da idéia do uso da mitologia ou elementos mitológicos pagãos na arte de contar histórias). Seu título será Palavra e imagem.
[1] – Na versão legendada em português, aparecem escritas estas expressões. Elas não foram suprimidas.
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Traduzido por: Rogério Portella